domingo, 20 de novembro de 2016

A mulher na Arte do século XVII

Clara Peeters - Natureza Morta com queijos, amêndoas e pães (c. 1612-1615)
Engana-se quem pensa que no séc. XVII a mulher foi protagonista apenas como tema a ser pintado. Ela também esteve à frente das telas pintando o seu mundo.
Como não podia deixar de ser,  nada foi muito fácil para aquelas que pretendiam seguir a profissão. Para começo de conversa, as mulheres não podiam sequer frequentar a academia, onde se aprendia anatomia artística, porque havia modelos masculinos posando nus. A possibilidade de ser aprendiz de um grande mestre da pintura era praticamente nula, pois uma jovem vivendo na casa de algum pintor da época não era visto com bons olhos. 
Possível autorretrato - Clara Peeters (?) -1610 

Assim, elas limitaram suas produções aos retratos e natureza morta, temática muito desenvolvida no Barroco (estilo vivenciado pela pintora). Se posicionaram no mercado com muita dificuldade e poucas conseguiram reconhecimento em vida.  Aqui, destacamos uma que além do reconhecimento, conseguiu viver de sua arte: Clara Peeters (1594 - 1657).
Encontra-se poucos dados biográficos sobre essa pintora flamenga. Sabe-se que Clara era filha do pintor Jan Peeters, nascida provavelmente na região da Antuérpia (Bélgica) e se especializou em naturezas mortas.  De acordo com Alejandro Vergara, que escreveu um ensaio sobre a pintora, Clara é a pioneira em pintar natureza morta com pescados. 

Clara Peeters, 1611. Natureza morta com pescado, vela, alcachofras, caranguejos e camarões
Still life - com flores e Cálices
Baseado na análise dos quadros da pintora, Vergara faz um interessante estudo da cultura material do século XVII, em que se destaca "objetos relacionados ao luxo, como copos e taças de prata dourada, vidros venezianos, saleiros de prata (o sal era bem escasso e precioso), porcelanas chinesas, conchas que eram valorizadas pela beleza, brilho e textura exótica."
Mas o que realmente chama atenção na produção pictórica de Clara são seus autorretratos refletidos em jarras e copos.  
Em algumas telas em que ela aparece refletida nos objetos, vê-se a imagem da artista com a paleta na mão, querendo sutilmente se mostrar, assim como fez Jan Van Eyck na famosa tela "O Casal Arnolfini" quando se retratou no espelho pintando o referido casal. Muito mais do que aparecer, era importante se reafirmar como pintora, como mulher e obviamente mostrar sua habilidade e maestria.


Outra forma de deixar sua marca nas pinturas era cravar o próprio nome em algum objeto presente na composição, aliás, uma prática usual desde o renascimento cujos pintores começaram uma busca não só para serem reconhecidos, identificados e requisitados como para eternizar seus nomes na história. Porém, a ideia de assinar o quadro de forma explícita como veremos a partir do século XVIII ainda não era completamente assumida, vindo sempre de forma disfarçada na pintura, como parte da composição.

Detalhe aproximado da primeira pintura apresentada neste artigo
Sobre o estilo de Clara, Vergara enfatiza "a sua descrição detalhada de formas e texturas, o elegante contraste entre objetos luminosos e fundos escuros que tornam a composição fabulosa.  Foi uma pintora valente, contra a corrente, cujas obras dão uma sensação de amor e cuidado". 

Vale a pena conferir mais algumas obras e seus detalhes e brincar de "onde está a Clara?" nos objetos reluzentes. 

Clara Peeters - 1611 - Mesa

detalhe da pintura "Mesa" 

Detalhe da pintura "Natureza morta com queijos, amêndoas e pães"

detalhe de "Still Life"



Vídeo divulgando a exposição de Clara Peeters que está em cartaz no Museu do Prado até o dia 19 de fevereiro de 2017, comentado por Alejandro Vergara.




Apesar de mostrarmos uma mulher que venceu o mito de inferioridade atribuido ao sexo feminino quando se trata de arte, ciência ou filosofia,  tenho a impressão de que o universo retratado por Clara infelizmente ainda define o local da mulher na visão de uma sociedade de classes caracterizada essencialmente pela dominação masculina. Reflete as mulheres como submissas e que por mais que se aventurem em outros mundos, não deviam sair da cozinha, aprisionadas em seus próprios reflexos...




Saudações Artísticas 🌷
Carla Camuso


Fontes: 

VERGARA, Alejandro (ed.) El arte de Clara Peeters, cat. exp., Amberes y Madrid, Koinklijk, Museum voor Schone Kunsten y Museo Nacional del Prado, 2016.
http://www.mujeresenlahistoria.com/2015/02/el-reflejo-de-la-artista-clara-peeters.html

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